O Distrito de Changara, em Tete, regista em média, 14 casos de gravidez precoce na adolescência por dia. Só no ano passado, pelo menos 5365 raparigas, dos 10 aos 24 anos de idade fizeram a 1ª consulta pré-natal no SAAJ, um incremento de 3% se comparado a igual período, ou seja, em 2020, há registo de 5228 jovens grávidas. Este problema já tira sono às autoridades do distrito que, neste momento desdobram-se em estratégias para reverter o cenário, com o apoio de parceiros. Para além de contribuir para o abandono à escola por parte da rapariga, propicia a cada vez mais a casos de casamentos prematuros e outras complicações decorrente desta prática.
Porque o acesso à educação e informação é a chave na educação sexual, pois quanto mais elevada a instrução, maior é o conhecimento da protecção da própria saúde, reduzindo deste modo o risco de contrair doenças. É com este propósito que, durante cinco dias, 10 provedores de saúde, entre Técnicos de Medicina Geral e Enfermeiras de Saúde Materno-Infantil, em representação das localidades de Dzunga, Missaua, Mazoé, Goba, Ntemangau e Changara Sede foram capacitados, semana finda, em matéria de Saúde Sexual e Reprodutiva e Comunicação Interpessoal, em Changara.
O objectivo é revitalizar o serviço de SAAJ, Saúde Escolar, potencializando os provedores de saúde com conhecimento sobre o pacote de saúde sexual e reprodutiva, incluindo a comunicação interpessoal, saúde e higiene menstrual, aborto seguro e, sobretudo, aprender como trazer e manter os adolescentes e jovens, incluindo os com deficiência, de 10 aos 19 anos, mais próximos do SAAJ.
Para Nelito Buana, Técnico de Medicina Geral e Formador Distrital do pacote SSR é importante alargar a base de conhecimento destes provedores para ajudar a camada juvenil no acesso à informação, até porque, é nesta fase que todas as mudanças ocorrem, desde as transformações comportamentais até físicas. O jovem deve conhecer o SAAJ, disse Nelito Buana para mais adiante lembrar do grande problema que assola Changara:
“Sucede que temos os SAAJ a funcionar no distrito, as consultas a ocorrem normalmente, mas notamos que, por um lado, estes adolescentes não tem fontes de informação, por isso já vem grávidas, o que contraria o nosso serviço que é de prevenção, mas por outro, há este défice de conhecimento por parte dos provedores de como lidar com o jovem, incluindo os com deficiência, portanto, há uma necessidade urgente de divulgar mais os serviços de SAAJ, que é nada mais do que, o lugar certo para os adolescentes e jovens se informarem sobre a sua sexualidade.
Os serviços de saúde, chamados SAAJ (Serviços de Saúde Amigos de Adolescentes e Jovens) têm como meta não apenas informar sobre saúde sexual reprodutiva e direitos dos jovens, mas também sobre a responsabilidade de oferecer aconselhamento, testagem de HIV, e métodos contraceptivos. Mas, na localidade de Mazoé, no Centro de Saúde Local, pouco disto acontece, porque segundo disse Celso Romessane Tebo, Director do Centro de Saúde local, esta camada juvenil não vai ao SAAJ porque não conhece, e nas zonais rurais ainda reinam alguns mitos e tabus em relação a Saúde Sexual e Reprodutiva, e mais, os pais e encarregados de educação dado ao factor pobreza tem sido eles, os principais promotores de casamentos prematuros quando a filha engravida ou quando atinge a puberdade.
“Nós como saúde, estamos preocupados com o crescente número de gravidezes precoces e elevados índices de Infecção por HIV no distrito e a localidade de Mazoé não é exceção. Esta formação veio em boa altura. Estamos a aprender técnicas e estratégias de aproximar o jovem ao SAAJ, e sobretudo como comunicar com estes jovens. Vamos, em simultâneo, trabalhar com os pais e encarregados de educação, visitar escolas e envolver as lideranças comunitárias para divulgar o SAAJ e acima de tudo incentivar estes a aderir aos serviços”, disse Celso Romessane, que olha para as 982 jovens e raparigas que engravidaram ano passado, com preocupação.
Contudo, não é só por falta de informação por parte dos jovens e adolescentes que os SAAJ não tem alcançado os seus resultados, em Changara. Em Dzunga, por exemplo, o Centro de Saúde local, que se localiza a 2km da fronteira com o vizinho Zimbabwe, onde há também, actividade sexual activa, funciona apenas com o SAAJ integrado, aliás é em todo distrito, que não tem um SAAJ especifico, com a exceção de Changara Sede, o que na voz da Cristina Timóteo contribui para a pouca aderência, visto que não há uma porta específica para atender às solicitações dos jovens, com toda delicadeza, rapidez necessária, aliado ao facto de apenas o serviço funcionar no período de tarde, dado ao grande fluxo no centro de saúde por outras patologias. Cristina Timóteo mais adiante veio confirmar que, a par das outras localidades, Dzunga também regista elevados casos de casamentos prematuros e gravidezes indesejadas. Só ano passado, estamos a falar de 672 raparigas grávidas. ‘’O maior desafio são as gravidezes precoces, e nesta formação ganhamos algumas habilidades, de como comunicar com os jovens e adolescentes e a expectativa é que consiga levar todo o aprendizado e replicar na minha unidade sanitária, para eliminar este problema que afecta as adolescentes. Nós oferecíamos os métodos contraceptivos, mas não num modo preventivo. Nós esperávamos que as adolescentes por si aparecessem na Unidade Sanitária, mas agora como meta, vamos reverter este quadro e adotar um mecanismo mais proactivo de sermos nós a visitar as escolas, lugares de maior aglomeração populacional de jovens, como campos de futebol para falar do SAAJ, tudo em vista a prevenir as gravidezes precoces e outras doenças sexualmente transmissíveis”, avançou Cristina, as estratégias a adotar em resposta ao problema.
Cristina Timóteo – responsável do Centro de Saúde de Dzunga
TER SAAJ ESPECIFICO AINDA É UM DESAFIO EM TETE – Reconhece DPS.
Ao nível da Direcção Provincial de Saúde é reconhecido o desafio da criação dos SAAJ específicos, e justifica nos seguintes termos. “ Nós temos essas deficiências nas nossas Unidades Sanitárias que são muito pequenas, dado ao tempo em que foram construídas. Temos também défice em termos de pessoal, que é exíguo. Este não é capaz de olhar por tudo, porque a mesma enfermeira tem de olhar o SAAJ, fazer o PF, CPN e outros serviços, por isso afirmamos que é um desafio”, disse Danílson Sténio, Chefe de Departamento de Saúde Pública em Tete, para mais adiante demostrar a sua satisfação em relação à parceria com ICRH-M, sobretudo no apoio ao programa de SAAJ. “ Agradeço ao parceiro pelo material de IEC e por esta formação, por isso, apelo em nome da DPS-T, aos formandos para captar o máximo do que aqui for partilhado e, principalmente, regressar aos vossos locais de trabalho, implementar e fazer a réplica para que o conhecimento chegue a outros sectores”, finalizou Danílson Sténio.
Porém, apesar deste quadro sombrio em Changara, vislumbra-se uma luz no fundo do túnel, disse Nelito Buana, na qualidade de formador destacando a parceria existente entre o Centro Internacional para Saúde Reprodutiva (ICRH-M) e os Serviços Distritais de Saúde, Mulher e Acção Social de Changara, (SDSMAS) na provisão de capacidades técnicas e a reabilitação e apetrechamento dos SAAJ, para que os adolescentes e jovens se sintam mais cómodos e à-vontade para falar da sua sexualidade e dispor de toda informação possível sobre SSR.
“Graças ao ICRH-M, e ao projecto Acesso sem Barreiras, que estamos aqui nesta formação intensiva, onde auguramos ter respostas positivas a médio e curto prazo, até porque as mesmas formações decorreram em simultâneo em Missaua, onde um grupo de activistas de saúde foi também capacitado nesta matéria para gerar demanda e criar referências para o SAAJ. Reconhecemos ainda existir muitos desafios, mas é de salutar esta iniciativa do ICRH-M através deste projecto”, argumentou Buana.
Changara, dada a sua localização geográfica, e por ser um corredor com os países do interland é principal porta de entrada à cidade de Tete. Regista um fluxo desusado de camionistas e a actividade sexual ganha relevo, dada a pobreza que caracteriza a vila, acaba arrastando muitas jovens e raparigas à actividade sexual. O projecto Acesso Sem Barreiras – Uma abordagem de desvio positivo e inclusivo para melhorar os serviços e comunicações em Saúde Sexual e Reprodutiva dos adolescentes é de 3 anos, é implementado nas províncias de Tete, concretamente em Tsangano e Changara e, na província de Maputo, em Moamba e Magude pelo consórcio formado pela PCI Media Impact, Centro Internacional para Saúde Reprodutiva e a TV Surdo. O doador é o Governo de Flanders.
