Os abortos inseguros, as consequências desta prática que muitas vezes culminam com a remoção do útero da mulher e mortes maternas, estão entre assuntos que preocupam a Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos. Por isso, durante três dias, 10 organizações membros da Rede DSR na província de Tete, estiveram reunidas na última semana em Tete, para analisar o desempenho da Rede, revitalizar os seus membros, e em conjunto refletirem sobre como podem fazer face a estes desafios. Apesar de avanços conseguidos com a aprovação e implementação da lei que despenaliza o aborto em Moçambique, há ainda práticas clandestinas e de corrupção ao nível das unidades sanitárias, aliado ao desconhecimento generalizado da existência da lei que minam os progressos já assinalados.
Deste workshop saíram propostas de intervenção, e um plano conjunto para ampliar os mecanismos de advocacia para a promoção dos direitos sexuais e reprodutivos. Acompanhe, a seguir, numa série de três episódios, as principais constatações desta revitalização da Rede DSR em Tete, e saiba que abordagens devem ser adoptadas para que os Direitos Sexuais e Reprodutivos sejam mais inclusivos e acessiveis, especificamente do aborto Seguro.
Neste primeiro episódio, conversamos com a Dra. Ivone Zilhão, membro do Comité de Coordenação da Rede Central, que orientou o workshop e contextualiza-nos sobre o nascimento desta rede e os desafios do aborto na implementação efectiva da lei em Moçambique.
Pergunta: Dra. Ivone Zilhão, a REDE DSR em Tete existe desde quando e quais ganhos já teve?
A REDE de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos existe em Tete desde março de 2020, quando foi implantada com sucesso graças ao apoio financeiro de SAAF através do projecto implementado pelo ICRH-M. Neste momento, estamos a conseguir dar acesso aos serviços de aborto seguro, principalmente para o grupo de adolescentes e jovens e não só, na província de Tete. Neste processo reforçamos igualmente que, para evitar as futuras gravidezes indesejadas é importante a oferta dos métodos contraceptivos.
Pergunta: O que significa dar acesso aos serviços de aborto seguro às mulheres e raparigas?
Se conseguimos dar o acesso a um aborto seguro a uma jovem adolescente, quer dizer que nós estamos a fazer dela uma esperança para que possa se empoderar, continuar a estudar, a trabalhar se for o caso e que ela possa fazer algo para o seu bem-estar.
Fiquei extremamente satisfeita, com o nível das conversas que nos tivemos ao nível da rede neste workshop de revitalização e reflexão do papel preponderante que se espera da REDE. Neste encontro, foram abordados assuntos relativos ao aborto, mas também de outros referentes aos Direitos Sexuais e Reprodutivos da Mulher, Direitos Humanos, uniões prematuras, violência baseada no género, questões relacionadas com a mortalidade materna.
Há algumas questões que ainda nos inquietam: por exemplo, em relação ao aborto que ainda não estão respeitados. Há algumas práticas dentro de algumas Unidades Sanitárias, que fazem descurar muito quanto à oferta dos serviços – Há quem oferece, mas condicionando ao pagamento, subornos, a cobranças ilícitas, etc..
Pergunta: E como resolver esta questão de cobranças ilícitas?
Só com muita mobilização, consciencialização a todos os níveis, nas instituições do estado, por exemplo, a saúde, educação, polícia, justiça, na juventude, para que haja uma oferta real do serviço e o aborto seja considerado um serviço essencial a saúde, porque agora ainda não é. Posso citar alguns exemplos: a mulher tem o direito ao parto assistido e nos promovemos isso, mas o mesmo não acontece quanto ao aborto seguro quando estas mulheres procuram. São vedados porque não tem o aborto gratuito, o que contraria a lei que prevê a gratuidade deste serviço.
Pergunta: E…… como minimizar estes riscos e ampliar o acesso a informação?
É usando o poder que estas organizações membros da Rede em Tete têm na implementação dos diversos programas de SSR, e podemos ver aqui, neste workshop de três dias, o comprometimento e motivação. Estão mais conscientes de que depende delas, do que o Ministério da Saúde – MISAU poder fazer mais em prol das mulheres e raparigas em Moçambique, porque este direito ao aborto seguro, entendemos nós que deve ser posto ao mesmo nível que qualquer outro programa, como por exemplo, o parto humanizado, consultas pré-natais em que todos os parâmetros de promoção e acessibilidade são observados. . O aborto seguro deve fazer parte desse serviço essencial e nós, não vamos parar enquanto não conseguirmos ter um aborto seguro para todas as mulheres e meninas que dele precisarem. Para isso, é importante apoio de todos, e foi muito proveitoso este workshop de 3 dias. (*)
“……. O direito ao aborto seguro, entendemos nós que deve ser posto no mesmo nível que qualquer outro programa de saúde. O aborto seguro deve fazer parte desse serviço essencial e nós, não vamos parar enquanto não conseguirmos ter um aborto seguro para todas as mulheres e meninas que dele precisarem…”.
Ivone Zilhão, médica de saúde pública, e Assessora Técnica de Ligação a Sociedade Civil, e membro do CC da Rede DSR nível central.
Debatidos os temas, analisados os cenários, ficou sempre a idéia de que é preciso fazer mais em prol dos direitos sexuais e reprodutivos, e a Rede DSR está a fazer o seu papel, mas, há que chamar a razão o papel activo do Ministério da Saúde.
Voltamos próxima semana, com o segundo episódio deste workshop de revitalização da Rede DSR em Tete, com intervenções de membros da Rede DSR de Tete. Fique connosco.